Saturday, February 24, 2007
Hilda Hilst: Small Arias. For Mandolin.
Before the world ends, Tulio,
Lay down and taste
The miracle of the flavor
That appeared in my mouth
While the world screams,
Belligerent. And beside me
You become Arab, I become Israeli
And we cover one another in kisses
And flowers.
Before the world ends
Before the end of
Our desire.
Árias Pequenas. Para Bandolim
Antes que o mundo acabe, Túlio,
Deita-te e prova
Esse milagre do gosto
Que se fez na minha boca
Enquanto o mundo grita
Belicoso. E ao meu lado
Te fazes árabe, me faço israelita
E nos cobrimos de beijos
E de flores
Antes que o mundo se acabe
Antes que acabe em nós
Nosso desejo.
Hilda Hilst: Amavisse
As if I were losing you-- that is how I want you.
As if I didn’t see you (golden broadbeans
Beneath the yellow)-- that is how I catch you brusque
Fixed, and I breathe you in whole
A rainbow of air in deep waters.
As if you allowed me everything else,
I photograph myself in iron gates
Ochre, tall, and I, diluted and small
In the rakishness of every farewell.
As if I lost you in the trains, in the stations
Or going around in a circle of water
A removing bird, that is how I add you to me:
Flooded by networks and yearnings.
*
Como se te perdesse, assim te quero.
Como se não te visse (favas douradas
Sob um amarelo) assim te apreendo brusco
Inamovível, e te respiro inteiro
Um arco-íris de ar em águas profundas.
Como se tudo o mais me permitisses,
A mim me fotografo nuns portões de ferro
Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima
No dissoluto de toda despedida.
Como se te perdesse nos trens, nas estações
Ou contornando um círculo de águas
Removente ave, assim te somo a mim:
De redes e de anseios inundada.
Wednesday, February 21, 2007
Hilda Hilst: Alcóolicas (III)
III.
Heights, strips, I climb them, I cut them out
And the two of us hover, Life and I
In the red of the tempest. Drunk,
We dive clear-headed into the croaking wine.
What stylish jest. What straight-backed
Seraphins. The two of us in vapors,
Lyrical and lobotomized, and the ditch
Becomes peak, and mud is transluscent
And Nothing is extreme.
I unpeel mad daily life
And its pasty rite of paraboles.
Patient, priestesslike, very well-mannered
We await the tepid dusk, the glass, the house.
Ah, everything becomes dignified when life is liquid.
III.
Alturas, tiras, subo-as, recorto-as
E pairamos as duas, eu e a Vida
No carmim da borrasca. Embriagadas
Mergulhamos nítidas num borraçal que coaxa.
Que estilosa galhofa. Que desempenados
Serafins. Nós duas nos vapores
Lobotômicas líricas, e a gaivagem
se transforma em galarim, e é translúcida
A lama e é extremoso o Nada.
Descasco o dementado cotidiano
E seu rito pastoso de parábolas.
Pacientes, canonisas, muito bem-educadas
Aguardamos o tépido poente, o copo, a casa.
Ah, o todo se dignifica quando a vida é líquida.
Hilda Hilst: Alcoólicas (II)
II.
Also raw and hard are the words and faces
Before we sit at the table, you and I, Life
Before the shimmery gold of drink. Slowly
Stillnesses, water lentils, diamonds appear
Over past and present insults. Slowly
We are two ladies, soaking in laughter, rosy
Like a berry, the one that I glimpsed in your breath, friend
When you allowed me paradise. The sinister of hours
Becomes a time of conquest. Languor and suffering
Become forgetfulness. After we lay down, death
Is a king who visits and covers us with myrrh.
You whisper: Ah, life is liquid.
Sunday, February 18, 2007
Hilda Hilst: Alcoólicas (I)
I.
Life is raw. A handle of tripe and metal.
I fall into it: a wounded stone embryo.
Life is raw and hard. Like a mouthful of viper.
I eat it on my pale tongue
Ink, I wash your forearms, Life, I wash myself
In the scant narrowness
Of my body, I wash the bone rafters, my life,
Your leaden nail, my rouge coat.
And we wander well-heeled the streets,
Crimson, gothic, tall bodies and glasses.
Life is raw. Ravenous like the crow’s beak.
And it can be so giving and mythic: a brook, a tear,
An eddy in the water, a drink. Life is liquid.
I.
É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mórula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livor da língua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha plúmbea, meu casaco rosso.
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, góticas, altas de corpo e copos.
A vida é crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é líquida.
Life is raw. A handle of tripe and metal.
I fall into it: a wounded stone embryo.
Life is raw and hard. Like a mouthful of viper.
I eat it on my pale tongue
Ink, I wash your forearms, Life, I wash myself
In the scant narrowness
Of my body, I wash the bone rafters, my life,
Your leaden nail, my rouge coat.
And we wander well-heeled the streets,
Crimson, gothic, tall bodies and glasses.
Life is raw. Ravenous like the crow’s beak.
And it can be so giving and mythic: a brook, a tear,
An eddy in the water, a drink. Life is liquid.
I.
É crua a vida. Alça de tripa e metal.
Nela despenco: pedra mórula ferida.
É crua e dura a vida. Como um naco de víbora.
Como-a no livor da língua
Tinta, lavo-te os antebraços, Vida, lavo-me
No estreito-pouco
Do meu corpo, lavo as vigas dos ossos, minha vida
Tua unha plúmbea, meu casaco rosso.
E perambulamos de coturno pela rua
Rubras, góticas, altas de corpo e copos.
A vida é crua. Faminta como o bico dos corvos.
E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima
Olho d’água, bebida. A vida é líquida.
Hilda Hilst: Of Desire (V)
V.
There is night, and there is darkness.
Night is God’s veiled heart
Which I, ashamed, no longer seek.
Darkness is when you distance yourself or say
That you are traveling, and an icy sun
Petrifies my face and frees me
From fidelity and enchantment. Desire
Of the flesh-- this doesn’t frighten me.
Just as it came to me, it doesn’t crush me.
You know why? I’ve fought That One.
And I was never its lackey.
V.
Existe a noite, e existe o breu.
Noite é o velado coração de Deus
Esse que por pudor não mais procuro.
Breu é quando tu te afastas ou dizes
Que viajas, e um sol de gelo
Petrifica-me a cara e desobriga-me
De fidelidade e de conjura. O desejo
Este da carne, a mim não me faz medo.
Assim como me veio, também não me avassala.
Sabes por quê? Lutei com Aquele.
E dele também não fui lacaia.
Hilda Hilst: Of Desire (IV)
VI.
What if I tell you that I saw a bird
Upon your sex, should you believe it?
And if it isn’t true, the Universe will not change at all.
If I say that desire is Eternity
Because the moment burns without end
Should you believe it? And if it’s not true
So many have said it that it could be.
In desire we are touched by sophomania, ornaments
Immodesty, shame. Why can’t I
Dot with innocence and poetry
Bones, blood, flesh, the now
And everything in us that will become misshapen?
IV.
Se eu disser que vi um pássaro
Sobre o teu sexo, deverias crer?
E se não for verdade, em nada mudará o Universo.
Se eu disser que o desejo é Eternidade
Porque o instante arde interminável
Deverias crer? E se não for verdade
Tantos o disseram que talvez possa ser.
No desejo nos vêm sofomanias, adornos
Impudência, pejo. E agora digo que há um pássaro
Voando sobre o Tejo. Por que não posso
Pontilhar de inocência e poesia
Ossos, sangue, carne, o agora
E tudo isso em nós que se fará disforme?
What if I tell you that I saw a bird
Upon your sex, should you believe it?
And if it isn’t true, the Universe will not change at all.
If I say that desire is Eternity
Because the moment burns without end
Should you believe it? And if it’s not true
So many have said it that it could be.
In desire we are touched by sophomania, ornaments
Immodesty, shame. Why can’t I
Dot with innocence and poetry
Bones, blood, flesh, the now
And everything in us that will become misshapen?
IV.
Se eu disser que vi um pássaro
Sobre o teu sexo, deverias crer?
E se não for verdade, em nada mudará o Universo.
Se eu disser que o desejo é Eternidade
Porque o instante arde interminável
Deverias crer? E se não for verdade
Tantos o disseram que talvez possa ser.
No desejo nos vêm sofomanias, adornos
Impudência, pejo. E agora digo que há um pássaro
Voando sobre o Tejo. Por que não posso
Pontilhar de inocência e poesia
Ossos, sangue, carne, o agora
E tudo isso em nós que se fará disforme?
Saturday, February 17, 2007
Hilda Hilst: Of Desire (I)
I.
Because there is desire within me, everything glimmers.
Before, daily life was thinking of heights
Seeking Another decanted
Deaf to my human bark.
Sap and sweat, they never came to be.
Today, flesh and bones, laborious, lascivious
You take my body. And what rest you give me
After the readings. I dreamt of cliffs
When there was a garden by my side.
I thought of climbs where there were no signs.
Ecstatic, I fuck you
Instead of yapping at Nothingness.
I.
Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando havia o jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.
Because there is desire within me, everything glimmers.
Before, daily life was thinking of heights
Seeking Another decanted
Deaf to my human bark.
Sap and sweat, they never came to be.
Today, flesh and bones, laborious, lascivious
You take my body. And what rest you give me
After the readings. I dreamt of cliffs
When there was a garden by my side.
I thought of climbs where there were no signs.
Ecstatic, I fuck you
Instead of yapping at Nothingness.
I.
Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando havia o jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.
Thursday, February 15, 2007
Emily Dickinson
"I never was with anyone who drained my nerve power so much. Without touching her, she drew from me. I am glad not to live near her."
Eu nunca estive com alguém que me esgotasse tanto os nervos. Sem tocá-la, ela me me drenava. Estou contente por não morar perto dela.
- Thomas Wentworth Higginson, escrevendo sobre Emily Dickinson.
"Her way of living, her isolation, she adopted out of necessity, for her nature like her poetry combined tenseness with exultation [...] No one was more aware of the draining effect in personal contacts than Dickinson herself."
Sua maneira de viver, a sua isolação, tudo isso ela adotou por necessidade—sua natureza, como sua poesia, misturava tensão e exaltação [...] Ninguém era mais ciente do efeito esgotador dos seus contatos pessoais do que ela mesma.
- Thomas H. Johnson, na sua introdução à coletânea Final Harvest, página viii.
Eu nunca estive com alguém que me esgotasse tanto os nervos. Sem tocá-la, ela me me drenava. Estou contente por não morar perto dela.
- Thomas Wentworth Higginson, escrevendo sobre Emily Dickinson.
"Her way of living, her isolation, she adopted out of necessity, for her nature like her poetry combined tenseness with exultation [...] No one was more aware of the draining effect in personal contacts than Dickinson herself."
Sua maneira de viver, a sua isolação, tudo isso ela adotou por necessidade—sua natureza, como sua poesia, misturava tensão e exaltação [...] Ninguém era mais ciente do efeito esgotador dos seus contatos pessoais do que ela mesma.
- Thomas H. Johnson, na sua introdução à coletânea Final Harvest, página viii.
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