Saturday, May 26, 2007
Hilda Hilst: Via espessa (do Desejo)
I.
From cicadas and stones, words want to be born.
But the poet lives
Alone in a corridor of moons, in a water-house.
From world maps, from shortcuts, voyages want to be born.
But the poet inhabits
The field of inns of insanity.
From the flesh of women, men want to be born.
And the poet pre-exists, between the light and the nameless.
I.
De cigarras e pedras, querem nascer palavras.
Mas o poeta mora
A sós num corredor de luas, uma casa de águas.
De mapas múndi, de atalhos, querem nascer viagens.
Mas o poeta habita
O campo de estalagens da loucura.
Da carne de mulheres, querem nascer os homens.
E o poeta preexiste, entre a luz e o sem-nome.
Saturday, May 5, 2007
Hilda Hilst: Ten Calls to a Friend
If I seem to you nocturnal and imperfect
Look at me again. Because tonight
I looked at myself as if you were looking at me.
And it was as if water
Desired
To leave your house that is the river,
Just slipping by, not even touching the riverbank.
I looked at you. And it has been so long
That I understand that I am earth. It has been so long
That I wait
For your brotherly body of water
To stretch over mine. Pastor and naut
Look at me again. From a lesser height.
And more attentively.
Dez chamamentos ao amigo
Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
Desejasse
Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.
Te olhei. E há tanto tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta
Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.
(I)
[Poesia: 1959-1979 - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]
Tuesday, May 1, 2007
Hilda Hilst: An Instant's Bitter Aria
Upon me the sudarium of things. A vast whiteness,
A transparency-layer upon the people. Look:
I do not look at you with your eye that knows
Almost everything in you is transient. My liquid-eye
Discovers a spent afternoon, a dawn-afternoon,
An elongated time where you made your widowhood.
You did not lose the woman or man you loved. We loved so much
And loss is daily and infinite. That’s not it
NOW
When I see you and I know of an elongated Time-Afternoon-Dawn.
You looked ahead, or beside you, or above you,
Or you didn’t look at all, or suddenly someone came into your living room
And you said clearly: should I say yes to the folks from the Extens Union?
Which yes? To whom? And am I myself, this person here?
Distance, mysterious incongruence, me myself?
His mouth continues: deadline loss ten percent final solution
Final final solution… You fold whole with much sobriety
The document in the last drawer, over to the left… My Father,
Between paper and me, between this table and me
And this whole gaping mouth, between me myself and he
Who repeats Union Union, which filament? Anchor,
Coagulated time, one day I was all rest and herding. One day
Everything was me, bulb that seduced, soothsaying gullet,
Viscous fat howl, I howled between the grapevines, I howled
Because I know about this NOW,
That the bitch of Time gnawed at me, that is was going to gnaw, that it growled while gnawing me
Bitch-time, you and I… what contour of nothing, what gone thing
In this double adventure, that… that yes, that yes… Look:
Say yes to those from the Extens Union.
Ária Amaríssima de um instante
SOBRE mim o sudário das coisas. Brandura extensa
Camada-transparência sobre as gentes. Vê só:
Eu não te olho com o teu olho que sabe
Que quase tudo em ti é transitório. Meu olho-liquidez
Descobre uma tarde esvaída, tarde-madrugada
Tempo alongado onde te fizeste em viuvez.
Não perdeste a mulher ou o homem que amavas. Amamos tanto
E a perda é cotidiana e infinita. Não é isso
AGORA
Quando te olho e sei de um Tempo-Tarde-Madrugada alongada.
Olhaste à tua frente, ou do lado ou acima de ti
Ou não olhaste, ou de repente alguém entrou na tua sala
E disse claramente: devo dizer que sim àqueles da Extens Union?
Que sim? A quem? E sou eu mesmo, este que está aqui?
Distância, sigilosa incongruência, eu mesmo?
A boca do outro continua: prazo perda dez por cento solução final...
Solução final final... Te dobras inteiro com muita sobriedade
O documento na última gaveta, bem à esquerda... Meu Pai,
Entre o papel e eu, entre esta mesa e eu
E essa boca inteira debulhada, entre eu mesmo e aquele
Que repete Union Union, que filamento? Âncora,
Tempo coagulado, um dia fui descanso e pastoreio. Um dia
Tudo era eu, bulbo que seduzia, goela clarividente
Uivo gordo viscoso, uivei entre as parreiras, uivei
Porque sabia deste AGORA,
Que a cadela do Tempo me roia, ia roer, rosnava me roendo
Cadela-tempo, tu e eu... que contorno de nada, que coisa ida
Nossa dúplice aventura, que... que sim, que sim... Olha:
Diga que sim a esses da Extens Union.
Texto extraído do encarte à edição de "Cadernos da Literatura Brasileira", editado pelo Instituto Moreira Salles - São Paulo, número 8 - Outubro de 1999)
Paulo Leminski: If Incense were Music
this of wanting
to be exactly that
which we are
is bound to
take us beyond
Incenso Fosse Música
isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além
(Source: "Distraído Venceremos" Ed. Brasiliense, 1987)
Paulo Leminski: I
i
when I look in the eyes
i know when a person
is inside
or outside
whoever is outside
doesn’t hold
a look that lingers
from within my center
this poem looks at me
eu
eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro de meu centro
este poema me olha
Subscribe to:
Posts (Atom)