Friday, August 24, 2012

Hilda Hilst: Poems to the Men of our Time


Beloved life, my death is late.
What to tell him,
Propose a trip? Kings, ministers
And all of you, politicians,
What word beyond gold and darkness
Remains in your ears?
Beyond your GREED
What do you know
Of men's souls?
Gold, conquer, profit, deception
And our bones
And people's blood
And the life of men
Between your teeth.

Amada vida, minha morte demora.
Dizer que coisa ao homem,
Propor que viagem? Reis, ministros
E todos vós, políticos,
Que palavra além de ouro e treva
Fica em vossos ouvidos?
Além de vossa RAPACIDADE
O que sabeis
Da alma dos homens?
Ouro, conquista, lucro, logro
E os nossos ossos
E o sangue das gentes
E a vida dos homens
Entre os vossos dentes.


---
Wolves? They are many.

But you can still
The word on the tongue
Quiet them.
The dead? The world.
But you can awaken it
Life-charm
In the written word.
Clearheaded? They are few.
But they will become thousands
If you join
The clarity of the few.
Rare? Your notable friends.
And you yourself, of course.
If you believe
The things that I say.


Lobos? São muitos.
Mas tu podes ainda
A palavra na língua
Aquietá-los.
Mortos? O mundo.
Mas podes acordá-lo
Sortilégio de vida
Na palavra escrita.
Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
Se à lucidez dos poucos
Te juntares.
Raros? Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro.
Se nas coisas que digo
Acreditares.


Wednesday, July 11, 2012

Poesia XXII - Hilda Hilst

Não me procures ali
Onde os vivos visitam
Os chamados mortos.
Procura-me
Dentro das grandes águas
Nas praças
Num fogo coração
Entre cavalos, cães,
Nos arrozais, no arroio
Ou junto aos pássaros
Ou espelhada
Num outro alguém,
Subindo um duro caminho

Pedra, semente, sal
Passos da vida. Procura-me ali.
Viva.


***

Do not look for me there
Where the living call upon
The so-called dead.
Look for me
Within the deep waters
In squares
Within a heart fire
Between horses, dogs,
In the ricefields, along the high bank
Or with the birds
Or mirrored
In someone else,
Climbing a hard path
Rock, seed, salt
Life's paths. Look for me there.
Alive.

Monday, May 30, 2011

Recycled poetry (poesia reciclada) - L.S. versus f.f.

Alguns versos nascem das entrelinhas entre uma língua e outra.

Poems feeding on themselves (Lavínia Saad versus f.f.).


I. (Lavinia Saad)

From the mouths of babes
Out of the mottled nightsky
Into the paper-grain
Words want to be born.

Over the steaming forest
Tales demand their telling.
Snippets of songs - and beats -
Bubble up through the sea-foam:
 pop! pop!
On the flatscreen dots
Dance impatiently their
Pixillated minuets. All await.

What do they say?
Hear me out! Spill me forth.
Words want to be born. And

It's just impossible
Not to write.


II. (f.f.)

Bem das bocas dos bebês
Fora do nouticéu matizado
Dentro das fibras do papel
Palavras pulsam no nascer.

Além da nebulosa floresta
Contos cobram as contas.
Retalhos de cantos - e tons -
Borbulham pela espuma-mar:
pop! pop!
Nessa lisavista os pontos
Dançam nervosos seus
celulados minuetos. Tudo espera.

O que dizem eles?
Ouve-me ao fim! Verte-me afora.
Palavras pulsam no nascer. E

Só é impossível
Não escrever.


III. (Lavinia Saad)


From between milkteeth that sprout
From newish gums
From the small void, like a bit of
Nightsky
Caught up in the fibres of this sheet:
Words throb as they are born.

Hovering above the huddled trees
Paragraphs, floating like spaceships
Shoot syllables
Through the green foamscape:
Zap! Zap!

On this glassy surface, dots dance
Nervously their little
Microscopic polkas. And
Everything
Pauses.

What does Everything say?
Listen to me! To the end! Vomit me out.
Words throb as they are born. And

The only impossible thing
Is to keep oneself from writing.


IV. (f.f.)
De entre os dentes de leite que brotam
Desde as novíssimas gengivas
Desde o pequeno vácuo, qual um bocado de
Nouticéu
Capturado nas fibras desta folha:
Verbos vibram ao nascer.
Adejando além das confusas árvores
Parágrafos, flutuam como espaçonaves,
Lançam sílabas
Através do verde espumescape:
Zap! Zap!
Nesta superfície vítrea, pontos pulsam
Nervosamente as suas
Microscópicas polcas. E
Cadacoisa
Pausa.
O que é que Cadacoisa diz?
Ouve-me! Até o fim! Vomita-me afora.
Verbos vibram ao nascer. E
A única coisa impossível
É manter-se aquém do escrever.
V. (Lavínia Saad)

Tal qual dentes-de-leite
Rompendo a tenra barreira

Palavras, pulsando,
Exigem o seu nascer.

Passo a ponta da língua
Pela dor-prazer.

Me é impossível--
impossível--
Não escrever.

Saturday, May 26, 2007

Hilda Hilst: Via espessa (do Desejo)





I.

From cicadas and stones, words want to be born.
But the poet lives
Alone in a corridor of moons, in a water-house.
From world maps, from shortcuts, voyages want to be born.
But the poet inhabits
The field of inns of insanity.

From the flesh of women, men want to be born.
And the poet pre-exists, between the light and the nameless.


I.

De cigarras e pedras, querem nascer palavras.
Mas o poeta mora
A sós num corredor de luas, uma casa de águas.
De mapas múndi, de atalhos, querem nascer viagens.
Mas o poeta habita
O campo de estalagens da loucura.

Da carne de mulheres, querem nascer os homens.
E o poeta preexiste, entre a luz e o sem-nome.


Saturday, May 5, 2007

Hilda Hilst: Ten Calls to a Friend





If I seem to you nocturnal and imperfect
Look at me again. Because tonight
I looked at myself as if you were looking at me.
And it was as if water
Desired

To leave your house that is the river,
Just slipping by, not even touching the riverbank.

I looked at you. And it has been so long
That I understand that I am earth. It has been so long
That I wait
For your brotherly body of water
To stretch over mine. Pastor and naut

Look at me again. From a lesser height.
And more attentively.





Dez chamamentos ao amigo


Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
Desejasse

Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.

Te olhei. E há tanto tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta

Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.
(I)


[Poesia: 1959-1979 - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]

Tuesday, May 1, 2007

Hilda Hilst: An Instant's Bitter Aria







Upon me the sudarium of things. A vast whiteness,
A transparency-layer upon the people. Look:
I do not look at you with your eye that knows
Almost everything in you is transient. My liquid-eye
Discovers a spent afternoon, a dawn-afternoon,
An elongated time where you made your widowhood.
You did not lose the woman or man you loved. We loved so much
And loss is daily and infinite. That’s not it
NOW
When I see you and I know of an elongated Time-Afternoon-Dawn.
You looked ahead, or beside you, or above you,
Or you didn’t look at all, or suddenly someone came into your living room
And you said clearly: should I say yes to the folks from the Extens Union?
Which yes? To whom? And am I myself, this person here?
Distance, mysterious incongruence, me myself?
His mouth continues: deadline loss ten percent final solution
Final final solution… You fold whole with much sobriety
The document in the last drawer, over to the left… My Father,
Between paper and me, between this table and me
And this whole gaping mouth, between me myself and he
Who repeats Union Union, which filament? Anchor,
Coagulated time, one day I was all rest and herding. One day
Everything was me, bulb that seduced, soothsaying gullet,
Viscous fat howl, I howled between the grapevines, I howled
Because I know about this NOW,
That the bitch of Time gnawed at me, that is was going to gnaw, that it growled while gnawing me
Bitch-time, you and I… what contour of nothing, what gone thing
In this double adventure, that… that yes, that yes… Look:
Say yes to those from the Extens Union.




Ária Amaríssima de um instante

SOBRE mim o sudário das coisas. Brandura extensa
Camada-transparência sobre as gentes. Vê só:
Eu não te olho com o teu olho que sabe
Que quase tudo em ti é transitório. Meu olho-liquidez
Descobre uma tarde esvaída, tarde-madrugada
Tempo alongado onde te fizeste em viuvez.
Não perdeste a mulher ou o homem que amavas. Amamos tanto
E a perda é cotidiana e infinita. Não é isso
AGORA
Quando te olho e sei de um Tempo-Tarde-Madrugada alongada.
Olhaste à tua frente, ou do lado ou acima de ti
Ou não olhaste, ou de repente alguém entrou na tua sala
E disse claramente: devo dizer que sim àqueles da Extens Union?
Que sim? A quem? E sou eu mesmo, este que está aqui?
Distância, sigilosa incongruência, eu mesmo?
A boca do outro continua: prazo perda dez por cento solução final...
Solução final final... Te dobras inteiro com muita sobriedade
O documento na última gaveta, bem à esquerda... Meu Pai,
Entre o papel e eu, entre esta mesa e eu
E essa boca inteira debulhada, entre eu mesmo e aquele
Que repete Union Union, que filamento? Âncora,
Tempo coagulado, um dia fui descanso e pastoreio. Um dia
Tudo era eu, bulbo que seduzia, goela clarividente
Uivo gordo viscoso, uivei entre as parreiras, uivei
Porque sabia deste AGORA,
Que a cadela do Tempo me roia, ia roer, rosnava me roendo
Cadela-tempo, tu e eu... que contorno de nada, que coisa ida
Nossa dúplice aventura, que... que sim, que sim... Olha:
Diga que sim a esses da Extens Union.


Texto extraído do encarte à edição de "Cadernos da Literatura Brasileira", editado pelo Instituto Moreira Salles - São Paulo, número 8 - Outubro de 1999)

Paulo Leminski: If Incense were Music



this of wanting
to be exactly that
which we are
is bound to
take us beyond


Incenso Fosse Música

isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além



(Source: "Distraído Venceremos" Ed. Brasiliense, 1987)

Paulo Leminski: I




i
when I look in the eyes
i know when a person
is inside
or outside

whoever is outside
doesn’t hold
a look that lingers

from within my center
this poem looks at me



eu


eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora

quem está por fora
não segura
um olhar que demora

de dentro de meu centro
este poema me olha

Sunday, April 29, 2007

Hilda Hilst: I Come from Ancient Times






God can be the great dark night
And for dessert
The flaming cherry sundae.

God: An icy surface anchored in laughter.



I come from ancient times. Long names:
Vaz Cardoso, Almeida Prado
Dubayelle Hilst... events.
I come from your roots, breaths of you,
And I love you tiredly now, blood, wine
Unreal cups corroded by time.
I love you as if there were more and derailings.
As if we stepped on ferns
And they screamed, both our victims:
Otherworldly, vehement.
I love you small like one who wants MORE
Like one who guesses everything:
Wold, moon, fox and ancestors.
Say of me: You are mine.




Venho de tempos antigos. Nomes extensos:
Vaz Cardoso, Almeida Prado
Dubayelle Hilst... eventos.
Venho de tuas raízes, sopros de ti.
E amo-te lassa agora, sangue, vinho
Taças irreais corroídas de tempo.
Amo-te como se houvesse o mais e o descaminho.
Como se pisássemos em avencas
E elas gritassem, vítimas de nós dois:
Intemporais, veementes.
Amo-te mínima como quem quer MAIS
Como quem tudo adivinha:
Lobo, lua, raposa e ancestrais.
Dize de mim: És minha.


Wednesday, March 28, 2007

Hilda Hilst: Nameless Songs






I.
May this love neither blind me nor follow me.
And may it never notice me.
May it spare me from being pursued
And from torment.
From only being so that he knows me.
May the gaze not lose itself among the tulips
Because such perfect forms of beauty
Spring from the glare of shadows.
And my Lord inhabits the glimmering dark
From a clutter of ivies on a high wall.

May his love only make me discontent
And tired of tiredness. And may I
Shrink before so many weaknesses. Small and soft
Like spiders and ants.

May this love see me only in parting.


I.
Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.

Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.

Que este amor só me veja de partida.




Source: Cantares do Sem Nome e de Partidas - SP: Massao Ohno, 1995.

Paulo Leminski: Minimal Distances



a bat text
finds its way with echoes
a blind text text
an echo from anti anti antiquity
a yelp on the wall wall wall
comes back green green green
with me with its its itself
to listen is to see yourself self self


Distâncias Mínimas

um texto morcego
se guia por ecos
um texto texto cego
um eco anti anti anti antigo
um grito na parede rede rede
volta verde verde verde
com mim com com consigo
ouvir é ver se se se se se

Monday, March 19, 2007

Paulo Leminski: Iceberg



An Arctic poem,
Of course, that is what I want.
A pale practice,
Three verses in ice.
A surface-phrase
Where no life-phrase
Will be possible.
No more phrases. None.
A null lyre,
Reduced to the purest minimum,
A blink of the soul,
The only unique thing.
But I speak. And, in speaking, I cause
Clouds of equivocations
(Or a swarm of monologues?)
Yes, winter, we are alive.




Uma poesia ártica,
claro, é isso que eu desejo.
Uma prática pálida,
três versos de gelo.
Uma frase-superfície
onde vida-frase alguma
não seja mais possível.
Frase, não, Nenhuma.
Uma lira nula,
reduzida ao puro mínimo,
um piscar do espírito,
a única coisa única.
Mas falo. E, ao falar, provoco
nuvens de equívocos
(ou enxame de monólogos?)
Sim, inverno, estamos vivos.



Paulo Leminski on Poetry




Poetry is a kind of heroism. For you to believe across the years in this useless thing that is the pure beauty of language, that is poetry -- it’s an act of heroism. It’s almost (I’d like to believe) a sort of sainthood.


A poesia é uma espécie de heroísmo. Você continuar ao longo dos anos acreditando nessa coisa inútil que é a pura beleza da linguagem, que é a poesia, é um heroísmo, é uma das molidades quase (eu gostaria de acreditar) de santidade.



* Obrigada ao Diego pela dica do vídeo.

Sunday, March 11, 2007

Hilda Hilst: Verses for a Beloved Gentleman



Verses with Much Love
For a Beloved Gentleman

I.
Ship
Bird
Windmill
And everything else I’ll become
So that I may
Step more gingerly
Along your path.

I.
Nave
Ave
Moinho
E tudo mais serei
Para que seja leve
Meu passo
Em vosso caminho.



XIII.
You say that I am vain.
And that, as you understand it,
Women of tender age
Who don’t want to become lost

Must not have so many
And such daydreams.

Sir, if I add to myself
Flowers and lace, satin,
If I loosen my hair in the wind
It’s for you, not for me.

I have two content eyes
And a fresh, rosy mouth.
And vanity only permits
Vanities when wished-for.

And besides you
I wish for nothing else.

XIII.
Dizeis que tenho vaidades.
E que no vosso entender
Mulheres de pouca idade
Que não se queiram perder

É preciso que não tenham
Tantas e tais veleidades.

Senhor, se a mim me acrescento
Flores e renda, cetins,
Se solto o cabelo ao vento
É bem por vós, não por mim.

Tenho dois olhos contentes
E a boca fresca e rosada.
E a vaidade só consente
Vaidades, se desejada.

E além de vós
Não desejo nada.

Source:
"Trovas de muito amor para um amado senhor"
(Poesia: 1959-1979 - São Paulo: Quíron; [Brasília]: INL, 1980.)

Friday, March 9, 2007

Hilda Hilst: Fragments




Fragments

Chaste and sad walls
Prisoners of themselves
Like creatures who grow old
Without knowing the mouth
Of men and women.
Dark walls, and shy:
Silken scorpions
In the nook of the rock.
There are lovely heights
That damage when touched.
Like your own mouth, love,
When it touches me.


Fragmentos

Muros castos e tristes
Cativos de si mesmos
Como criaturas que envelhecem
Sem conhecer a boca
De homens e mulheres.
Muros Escuros, tímidos:
Escorpiões de seda
No acanhado da pedra.
Há alturas soberbas
Danosas, se tocadas.
Como a tua própria boca, amor,
Quando me toca...